À primeira vista, parece que está tudo bem. Nunca tivemos tanta informação disponível, tanto acesso a indicadores de mercado e de comportamento de consumidores. Nunca ouvimos falar tanto de novas tendências sobre o futuro, desde Nostradamus. Em certo sentido, é como se conhecêssemos quase tudo sobre a vida de quase todos. Como se eles estivessem despidos diante de nós.
Montanhas de dados à nossa disposição. Os computadores de lojas, cartões de crédito, hotéis, carteira de clientes vomitam números para os detentores dessas máquinas. Eles descrevem com detalhamento minucioso de com “paciência de monge” tudo o que as pessoas estão fazendo em todos os momentos de contato de suas vidas. Uma verdadeira ressonância magnética de nossa intimidade. Um scan de todos os nossos passos na relação com as marcas, as empresas e as instituições. Porém, o que eles andam fazendo com esses números é o que ainda não se sabe bem. Antigamente, guardavam-se coupons de promoção de Natal de shoppings com o nome do comprador em alguns porões, porque não se sabia que utilidade teria aquela montanha de nomes com informações pessoais, depois dos sorteios. Na era dos algoritmos, “porões digitais” substituíram os antigos sub-solos úmidos dos coupons. Os algoritmos que nos vigiam e nos acompanham continuam sem saber como nos identificar pra valer. As companhias aéreas, com todos os nossos movimentos gravados, nunca nos trataram tão mal. As ofertas e convites de empresas, balizadas matematicamente, não conseguem me enxergar como pessoa. Eu que, na Amazon, só compro livros técnicos há muitos anos, emprestei minha conta para minha sogra comprar e pesquisar coisas para jardinagem.
Dito e feito, virei alvo de livros e instrumentos de jardinagem e meu longo histórico anterior foi misturado por um Jaime vestido com um algoritmo de jardineiro. Ainda bem que depois de mais algumas compras de livros, eles abandonaram meu pendor por jardinagem. Outro exemplo simples? Se eu tivesse aceito todos os convites para me associar a um determinado cartão de crédito, já teria cinco cartões iguais porque sempre me oferecem um como se fosse a primeira vez.
Pois é, estou farto dessa sacralização do universo infinito de informações que estão à nossa disposição, como se fossem vigias da nossa existência. Inspetores de quarteirão.
Em nossa vida profissional, em nossos planejamentos, em nossas buscas por ideias que movam a empresa, estamos cada vez mais obesos de informação e, talvez por isso mesmo, gordos, inchados e incapazes de enxergar o bem mais precioso que são os insights.
Insights de mercado, insights de consumidores, brand insights. Esta é a ideia mais valiosa que alimenta a engenharia de marketing e comunicação e, em última instância, a roda da economia.
O insight tem algumas características. A primeira delas é que ele é raro. E é difícil de ser imitado por marcas e empresas concorrentes. A comparação com uma pedra preciosa não é uma metáfora barata apenas.
A segunda é que ele, o insight, não se confunde com o material bruto, a pilha de informações de onde é extraído. Ele não deriva automaticamente do universo dos números, dados, indicadores. Ele é um ato de revelação que ocorre em nossa mente. Não em todas, é claro. Apenas naquelas que não se encantam com a obesidade dos números e informações. Insights são a fonte do valor, os dados não.
Acabei ler o livro Creating Market Insight (B.Smith e P.Raspin) e o que eu sempre imaginei ficou ainda mais cristalino. Do dado para a informação, da informação para o conhecimento, do conhecimento para o insight e dele para o valor. Como todo caminho que leva à revelação, ele é longo, tortuoso, angustiante. Ele nos obriga a abandonar as tentações do imediatismo, das informações e dados que apenas nos engordam, dos atalhos sedutores que nos levam de volta para o começo.
Não me crucifiquem, reparem bem, em momento algum eu disse que insights são coelhos tirados da cartola, sem serem alimentados por dados de realidade. É bem verdade que são produtos de mentes treinadas e brilhantes, mas que operam a partir de materiais brutos e não a partir do vazio.
Hoje, estamos obesos de informação e anoréxicos de insights. Big data e small ideas. Essa é uma das razões do porque investimentos encolhem. Em toda minha vida profissional não me lembro de ter visto uma empresa ter deixado de “cavar” uma verba, mesmo quando não existia, diante de uma grande ideia, de um insight luminoso. Se deixarmos de nos encantar com o oceano de dados e informações que nos cercam e acreditarmos que eles são apenas um ponto de passagem, vamos acabar chegando onde ele está. Esqueçam a preocupação com volume, como eu repito quase todo dia para o meu pessoal, nós estamos é em busca de valor.
O insight não está nas tabelas, não está nas salas de discussões de grupo, não está nas redes sociais, não está nos indicadores de mercado, não está nas infinitas páginas da internet. Está no mesmo lugar onde sempre esteve e onde sempre estará: em nossa capacidade mental de identificá-lo, de ver a pedra brilhando no meio da ganga. É acima de tudo, um ato de criação de mentes curiosas e inquietas. O que requer energia e cabeças pensantes, que vão muito além da engenharia matemática ou de gráficos artisticamente construídos. Minha formação como Engenheiro Químico sente-se feliz com a montanha de dados disponíveis. Mas é como Sociólogo que me sinto inspirado e curioso para escavar insights escondidos sob a superfície dos dados.
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