Para muita gente, marca ainda é apenas ou sobretudo uma identidade gráfica, uma forma, cores, um estilo visual enfim. Um elemento pelo qual reconhecemos sua existência ou a existência da empresa que ela representa.
Essa não é uma visão errada. Mas apenas uma pobre metonímia que ignora algo muito maior que é o todo, a verdadeira dimensão da marca.
Na sua plenitude, quando entendidas e administradas com sabedoria e consistência, as marcas são supremas ferramentas de negócio. Elas encapsulam o propósito das organizações, são poderosas pontes de relacionamento. Elas servem para qualificar, perceptualmente, a natureza dos produtos e serviços que representam e para simbolizar a promessa que esses produtos e serviços fazem. Obviamente, isso tudo funciona bem quando a promessa é sustentável pela entrega, isto é, pela qualidade do que é entregue ao cliente ou consumidor. Afinal, mentira tem pernas curtas, e cada vez mais curtas, porque, neste mundo da engenharia digital, ninguém se esconde por muito tempo. Não há marca forte que resista a produto ruim. O mundo está cheio de tristes bons exemplo disso.
Mas, além de todas essas virtudes, há um supremo benefício na existência de uma marca, que transcende as operações de comunicação, marketing, branding. Estas operações são a “maternidade” das marcas, o lugar onde são conceituadas, posicionadas em seu mercado.
Aí, ela sai desse ambiente protegido onde nasceu, embora continue tendo assistência de seus “pediatras” e dos atentos cuidados maternais da família de que descende.
Filha de boas famílias, bem alimentada, educada em boas escolas, com uma visão que vai além do ambiente familiar, da vizinhança e amizades apenas, ela, a marca, inicia sua inserção social, ou melhor, mercadológica. É quando ela floresce e revela o valor que tem para a casa de onde provém. Ela se transforma num ativo econômico e, como todo ativo econômico, ela é responsável por uma fração do fluxo de caixa, ou seja, dos recebíveis que a empresa gera.
É a partir daí que entendemos o quanto ela é uma forma de gerar dindim, de representar valor.
Hoje é comum darmos de cara na imprensa com rankings que mostram o valor econômico de marcas. Recentemente, vi um ranking mostrando as marcas mais valiosas no Brasil, entre as que foram auditadas. Nesse estudo da Kantar, a marca Itaú despontava em primeiro lugar, valendo um pouco mais de 7 bi de dólares, seguida de Brahma, Skol, Claro, Nubank, Bradesco.
E por que, não essas do ranking apenas, mas marcas em geral valem o dinheiro que valem, uma pergunta recorrente que já ouvi ad nauseam.
A razão é, conceitualmente, simples, embora não seja tão fácil de calcular. A marca é uma das razões pelas quais escolhemos o produto, mutas vezes semelhante tecnicamente a seus concorrentes. O peso que ela tem nessa escolha é o quanto o fluxo de caixa da empresa será alimentado a mais pela existência da marca. Em outras palavras, sem ela, a decisão de escolha do comprador recairia provavelmente numa concorrente.
Imagine um cálculo, e isso já não é tão simples de ser feito, que projete o fluxo de caixa dos produtos de uma determinada marca por N anos. Nesse montante de dinheiro, descubra qual foi a fração de participação da marca na geração do fluxo. Em seguida, como é habitual em finanças, traga esse montante total a valor presente. Ao fazermos isso, teremos um número que é o valor econômico atual da marca. Eu disse e repito: é uma operação que exige habilidades matemáticas e financeiras complexas, mas é um dos caminhos clássicos para chegar ao valor que ela representa.
A distância entre a visão primária e ingênua da marca, como apenas uma sinalização gráfica e o seu significado pleno como ferramenta de negócios e como um ativo econômico é muito grande. Na “astronomia” dos negócios, essa distância é contada em anos-luz.
É a distância entre um papel apenas cosmético e o papel de quem traz para casa dindim, no fim do dia.
Artigo publicado originalmente na Gazeta do Espírito Santo
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